A Associação Meditar é uma sociedade civil com personalidade jurídica, sem fins lucrativos, não religiosa ou doutrinária. O primeiro núcleo surgiu em Porto Alegre-RS, e, atualmente, possui núcleos nas cidades de Santa Cruz do Sul, Lajeado, Novo Hambugo, Santa Maria, São Francisco de Paula, Capão da Canoa, Florianópolis, Chapecó e Cuiabá.

A Associação Meditar se propõe a: Difundir a prática da meditação; Congregar os praticantes da meditação; Coletar e divulgar os benefícios à saúde física e mental promovidos pela prática adequada da meditação; Criar, apoiar e promover a difusão de locais adequados para a prática de meditação (Núcleo ou Centros Meditar) no Brasil e no exterior; inclusive, com sedes rurais para abrigar seus membros em vida comunitária voltada à meditação, ao estudo, ao trabalho natural na terra, à contemplação da natureza.

Dedica-se a orientar a iniciação e o desenvolvimento das pessoas (empresa, escolas, associações) na meditação de forma clara, simples, objetiva e segura; Promover cursos, palestras, workshops, retiros e atividades voltadas à prática da meditação; Incentivar e promover a atitude mediativa, altruísta e pacífica, que implique na paz interna e externa, na não-violência, no respeito pela natureza, alimentação natural, bons valores humanos, no conhecimento e na sabedoria.

A Associação Meditar de Cuiabá se reúne sempre aos Sábados, às 08h00, no Espaço Ligia Prieto. Endereço: Rua Min.João Alberto, 137 – Araés - Cuiabá. Informações pelo tel. (65)3052-6634.

domingo, 7 de novembro de 2010

Budismo e Ciência


Thich Nhat Hanh


Um dia um grupo de jovens de Kalama veio visitar o Buda enquanto ele estava naquela área. Eles perguntaram, “Querido professor, muitos professores vieram aqui e cada um deles defende que seu ensinamento é a verdade, é o absoluto. Cada um diz que deveríamos segui-los e não seguir a outro professor. Qual é a sua idéia?” O Buda disse: “Não se apresse em acreditar em nada, mesmo se estiver escrito nas escrituras sagradas. Não se apresse em acreditar em nada só porque um professor famoso disse. Não acredite em nada apenas porque a maioria concordou que é a verdade. Você deveria testar qualquer coisa que as pessoas dizem através de sua própria experiência antes de aceitar ou rejeitar algo.”

O que o Buda disse é verdadeiramente científico. O budismo não pode ser descrito como ciência, mas tem o espírito científico.

Como cientista, depois de algum tempo pesquisando e fazendo vários experimentos, você descobre algo. Feita a descoberta, você tem que publicar o que descobriu, porque acredita que descobriu a verdade, uma verdade científica. Depois de ter publicado seu achado em uma revista científica, outras pessoas irão olhar para ele e haverá um número muito pequeno de especialistas no seu campo de pesquisa que irão determinar se seu achado é verdade ou não. Para fazer isso, eles irão testar por eles mesmos. Eles não podem apenas dizer que o que você disse é verdade porque eles são especialistas naquele campo. Eles têm que provar com sua própria experiência. A grande maioria das pessoas que não é especialista no campo, apenas acredita, porque não temos meios de testar a descoberta de forma a verificar a verdade. Temos que acreditar em um número muito pequeno de cientistas daquele campo de atuação.

No domínio da ciência há muitas crenças. Acreditamos no que os especialistas dizem sem testarmos por nós mesmos. Mesmo assim, tendo sido provado que era a verdade, dez ou vinte anos depois uma nova verdade é considerada superior, mais profunda, mais verdadeira que a verdade anterior. E novamente haverá um punhado de especialistas que tentarão confirmar e nós, a maioria, vamos seguir. Neste caminho nos comportamos como pessoas religiosas, mesmo no domínio da ciência.

E sobre a prática do budismo? No budismo, o objeto de nossos estudos é a mente e como ela se relaciona com o sofrimento e a felicidade. Não estamos tão preocupados com a mesa ou a nuvem, com o átomo ou as estrelas. Mas estamos preocupados com o sofrimento e felicidade. Não somos filósofos. Não especulamos sobre felicidade e sofrimento. Queremos realmente observar nosso sofrimento, observar nossa felicidade. Queremos achar uma solução. Queremos nos liberar do sofrimento. Queremos trazer felicidade verdadeira. E esse é o trabalho real que não pode ser feito apenas falando.

Quando você senta em meditação, segue sua respiração e gera a energia da plena consciência e concentração, tem os instrumentos para trabalhar. Pode reconhecer e abraçar seu sofrimento. Pode cultivar o tipo de sabedoria que pode ajudar a desintegrar o sofrimento. Você pode fazer isso no espírito empírico – você realmente entra nele, e não apenas fala sobre ele. Seu sofrimento é a realidade e você o reconhece. Você entra nele, analisa e usa sua plena consciência, concentração e insight de forma a transformá-lo. É como um cientista usando seus instrumentos de forma a olhar profundamente na natureza do que está lá. E depois de usar o método de transformação e cura, você pode querer compartilhar isso com seus alunos ou amigos.

Há bons praticantes de meditação que tem mais ou menos o mesmo tipo de experiências. Eles tentam verificar e experimentar o mesmo tipo de coisa. Se eles forem bem sucedidos, podem dizer: “O que você nos disse é verdade. Eu tive a mesma experiência.” Mas muitas pessoas em volta apenas acreditam, sem ter a experiência. Portanto não há grande diferença entre ciência e budismo. Muitos budistas apenas acreditam. Há apenas um punhado de nós que podem testemunhar a verdade que foi descoberta.

Budismo às vezes descreve a mente e às vezes o mundo, mas essa descrição não é pelo prazer da descrição. A descrição objetiva a prática. Se você aprender sobre a mente é porque quer praticar bem. Não é porque quer uma bela doutrina sobre a mente. Se você falar sobre impermanência e não-eu não é pelo prazer de descrever a realidade como sendo impermanente e livre de um eu separado. Essa descrição é um instrumento que o ajuda a se liberar, porque a verdade da impermanência e não-eu podem te ajudar a superar seu desespero, seu medo e assim por diante. Portanto há uma diferença.

Quando um cientista estuda uma partícula, tem que usar instrumentos, aceleradores de partícula e outros, mas ele tem que usar a mente também. A maioria dos cientistas fica fora da partícula como um observador, e a partícula se torna o objeto da observação. Mas na experimentação dos praticantes budistas, você não fica fora como um observador. Não pode se estabelecer como observador. Tem que se tornar participante, porque o bloco de sofrimento que você experimenta não é o objeto de sua observação. É você. Você é o bloco de sofrimento. É por isso que o Buda disse para se praticar a contemplação do corpo no corpo, contemplação dos sentimentos nos sentimentos. Não é possível ficar de fora, em pé, observando. Você tem que se tornar uno com o objeto que observa. Esta é a diferença entre ciência e budismo, e os cientistas modernos começaram a ver isso.

O físico britânico David Bohm disse que de forma a realmente entender o átomo você teria que parar de ser apenas um observador. Deveria começar a ser um participante. Isto é muito próximo da disciplina da meditação.

A esquerda política acredita na ciência, no liberalismo, na razão. Eles lutam com todas as forças contra o fundamentalismo e o dogmatismo, mas ainda sofrem muito. Eles não têm força suficiente. Politicamente falando eles perderam a eleição. Como eles apóiam a ciência e a liberdade de pensamento, são anti-dogmáticos, sim, mas isto ainda não é suficiente. Eles não estão aptos a trazer a dimensão espiritual para dentro das suas vida. É possível ter dimensão espiritual na nossa vida diária, na nossa política, na nossa vida econômica, sem sermos capturados pelo fundamentalismo?

O Buda provou que era liberal, mas ele era profundamente espiritual. É por isso que ao falar em evolução biológica você tem que falar em evolução cultural, evolução espiritual, que tem o poder de nos liberar do dogmatismo e do fundamentalismo. A questão é como a ciência e a meditação podem dar as mãos de forma a ir em frente ao futuro, para nossa liberação. Esta é uma questão de nosso tempo.

Em agosto de 2006, teremos um retiro sobre a Mente e a Neurociência, e teremos uma chance de tocar nesse problema. Budismo às vezes parece uma religião, mas não é verdadeiramente uma religião. Às vezes parece ciência, mas não é ciência, por que estamos preocupados com a realidade última. Nós gostamos de fazer perguntas, mas também queremos nos transformar, nos curar. Há dentro do budismo uma tremenda fonte de sabedoria e experiência passada pelo Buda através de muitas gerações de praticantes. Podemos aprender muito de suas experiências de forma que possamos por nossa vez nos transformar e ajudar a curar e transformar o mundo.

(Transcrito de um Dharma Talk de Thich Nhat Hanh em um retiro para cientistas em 17 de novembro de 2005 em Plum Village)
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