A Associação Meditar é uma sociedade civil com personalidade jurídica, sem fins lucrativos, não religiosa ou doutrinária. O primeiro núcleo surgiu em Porto Alegre-RS, e, atualmente, possui núcleos nas cidades de Santa Cruz do Sul, Lajeado, Novo Hambugo, Santa Maria, São Francisco de Paula, Capão da Canoa, Florianópolis, Chapecó e Cuiabá.

A Associação Meditar se propõe a: Difundir a prática da meditação; Congregar os praticantes da meditação; Coletar e divulgar os benefícios à saúde física e mental promovidos pela prática adequada da meditação; Criar, apoiar e promover a difusão de locais adequados para a prática de meditação (Núcleo ou Centros Meditar) no Brasil e no exterior; inclusive, com sedes rurais para abrigar seus membros em vida comunitária voltada à meditação, ao estudo, ao trabalho natural na terra, à contemplação da natureza.

Dedica-se a orientar a iniciação e o desenvolvimento das pessoas (empresa, escolas, associações) na meditação de forma clara, simples, objetiva e segura; Promover cursos, palestras, workshops, retiros e atividades voltadas à prática da meditação; Incentivar e promover a atitude mediativa, altruísta e pacífica, que implique na paz interna e externa, na não-violência, no respeito pela natureza, alimentação natural, bons valores humanos, no conhecimento e na sabedoria.

A Associação Meditar de Cuiabá se reúne sempre aos Sábados, às 08h00, no Espaço Ligia Prieto. Endereço: Rua Min.João Alberto, 137 – Araés - Cuiabá. Informações pelo tel. (65)3052-6634.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Reconhecimento

Por Thich Nhat Hanh

Alguém poderá perguntar: é então o relaxamento o único objetivo da meditação? Na verdade a meditação vai muito mais além. O relaxamento, entretanto, é necessário como ponto de partida, já que só após obtê-lo é que a pessoa consegue tranqüilizar o coração e clarear a mente. Ter o coração tranqüilo e mente clara já é avançar bastante no caminho da meditação.

Não devemos nos esquecer de que alertar a mente para a respiração é um método maravilhoso que pode ser usado sempre e não apenas no início da prática. No século III, assim escreveu o mestre zen Tang Hoi em seu comentário sobre o Sutra Anapanasati: "Manter a mente alerta à respiração é o grande veículo usado por Buda para salvar todos os seres presos no ciclo de nascimento e morte". Medir, seguir e controlar a respiração são, portanto, instrumentos poderosos que nos habilitam ao controle da mente.

E, para obter controle da mente e aquietá-la, temos que estar alertas também para os nossos sentimentos e percepções, observando e reconhecendo cada sentimento ou pensamento que surge. Assim se referiu a respeito o mestre zen Thoung Chien, ao fim da dinastia de Ly. "Se o praticante for capaz de enxergar claramente como funciona sua mente, poderá obter resultados com pouco esforço. Do contrário, todo seu esforço será perdido". Só há uma forma de se conhecer a mente: observar e reconhecer tudo sobre ela. E isto deve ser feito todo o tempo, não só nos momentos de meditação como também no dia-a-dia.

Inúmeros pensamentos e sentimentos surgem durante a meditação. E se não estivermos atentos à respiração, seremos arrastados por eles. Mas a respiração não é apenas um meio através do qual podemos nos tomar imunes a tais pensamentos e sentimentos. A meditação é o veículo que, unindo o corpo à mente, abre as portas da sabedoria.

Nossa intenção, ao surgir um sentimento ou pensamento, não deve ser de afugentá-los, pois, continuando nós concentrados na respiração, eles se afastarão naturalmente. Tampouco deve ser de odiá-los, espantar-se ou preocupar-se com eles. O que deve então ser feito? Simplesmente reconhecer a presença deles. Se surge, por exemplo, um sentimento de tristeza, reconheça-o imediatamente: "Um sentimento de tristeza está surgindo em mim". Se o mesmo sentimento continuar, continue a reconhecê-lo: "Um sentimento de tristeza continua existindo em mim". Se surge um pensamento como: "É tarde, mas os vizinhos ainda estão fazendo barulho", reconheça-o da mesma forma e se o mesmo continuar, reconheça que ele está continuando a existir. Reconheço, enfim, qualquer espécie de sentimento ou pensamento que surja. O essencial é não deixar que eles surjam sem que os reconheça prontamente, tal como a sentinela que, à porta do palácio, observa cada fisionomia que entra ou sai.

Não havendo nenhum sentimento ou pensamento, reconheça não estar havendo nem um nem outro. Esse treino nos faz tomar consciência dos nossos sentimentos e pensamentos. E, através dele, você poderá manter o controle da mente. Pode-se, pois, juntar o método de alertar a mente à respiração ao de tomar consciência dos pensamentos e sentimentos ao mesmo tempo.  

Sem ilusões, a mente torna-se verdadeira. Ao praticar o exercício de alertar a mente, não se deixe dominar pela distinção entre bom e mau, criando assim uma luta em seu interior. Sempre que um pensamento positivo surja, reconheça isso: "Um pensamento positivo acaba de surgir". Não se apegue ao pensamento, mesmo que este lhe seja agradável, assim como não tente repeli-Ia mesmo que ele lhe seja desagradável. Reconhecê-lo é o suficiente. Se você tiver se distraído, deve saber que se distraiu, e, se estiver presente, deve reconhecer que está presente. Uma vez alcançada essa consciência, nada mais o perturbará.  

Quando me referi à sentinela do palácio, você deve ter imaginado um corredor com duas portas, uma de entrada e outra de saída e sua mente qual sentinela registrando cada sentimento ou pensamento que entra ou sai. Mas a imagem tem uma falha, isto é, a idéia de que o que entra e sai é diferente da sentinela, pois os nossos pensamentos e sentimentos são nós mesmos. São partes de nós. Existe a tentação de considerá-los todos ou alguns deles como forças inimigas que tentam perturbar-nos.

Mas, na verdade, quando estamos com raiva, nós mesmos somos a raiva. Quando estamos felizes, nós mesmos somos a felicidade! Nós somos a sentinela e o visitante ao mesmo tempo. Somos ambos: o observador da mente e a mente ao mesmo tempo. Por conseguinte, tentar segurar ou repelir qualquer pensamento não é o importante. O importante é estar consciente dele. Esta observação não é uma objetificação da mente, não estabelece distinção entre sujeito e objeto. A mente não segura a mente, a mente não repele a mente, a mente pode apenas observar-se a si mesma. Esta observação não é a observação de um objeto exterior, independente do observador.

O koan do mestre zen Bach An ilustra bem isso:

"Qual o som de uma mão batendo palma?" Ou, outro exemplo: "O que separa o paladar e a papila gustativa?" A mente percebe a si própria, em si própria. Isto é de grande importância, tanto que, no Surra da Mente Desperta, Buda usa várias vezes a frase: "Conscientizar-se do sentimento no próprio sentimento, conscientizar-se da consciência na própria consciência". A consciência do sentimento no próprio sentimento é a consciência direta do sentimento enquanto ele está sendo experimentado e não a contemplação de uma imagem do sentimento, criada para objetificá-lo como existência externa separada daquele que contempla.

A consciência do sentimento no sentimento é a mente experimentando a consciência da mente na mente. A objetificação de um observador de fora para examinar algo é método da ciência, não da meditação. Por isso, a imagem da sentinela e dos visitantes (pensamentos e sentimentos) entrando e saindo pelo portão da mente é falha para ilustrar adequadamente a observação da mente na mente.

A mente, diz o Sutra, é como um macaco na floresta, saltando de galho em galho. Para não perder o macaco de vista, em algum rápido movimento, temos que observá-lo constantemente e nos tornarmos unos com ele. Mente contemplando a mente, é como um objeto e sua sombra - o objeto não pode afastar sua sombra. Os dois são um só. Onde quer que vá, a mente está sempre subordinada a si própria. O Sutra usa, algumas vezes, a expressão "Amarre o macaco" para significar "Tenha controle da mente". Mas a imagem do macaco é apenas um meio de expressão. Não há duas mentes, uma que pula de galho em galho e outra que segue atrás para amarrá-lo com uma corda.

Geralmente, a pessoa que medita espera "ver dentro de sua própria natureza" e, assim, poder despertar. Mas, se você está apenas começando, não espere "ver dentro de sua própria natureza". Ou melhor, não espere nada. Não espere especialmente ver Buda ou qualquer versão da "realidade última" enquanto está meditando.

Nos primeiros seis meses, procure apenas estabelecer e desenvolver seu poder de concentração, criar calma interior e contentamento sereno. Você afastará a ansiedade, terá real descanso e aquietará sua mente. Você se renovará e adquirirá uma ampla, clara visão das coisas, aprofundando e reforçando o amor existente em si.

Meditar é alimento para o espírito e para o corpo. Através da meditação nosso corpo adquire harmonia, leveza e paz. O caminho a percorrer entre observar sua mente e "ver dentro de sua própria natureza" não será muito áspero. Uma vez capaz de acalmar sua mente, uma vez que seus sentimentos e pensamentos não mais o perturbem, terá chegado ao ponto em que sua mente se estabelecerá na mente. Ela terá controle direto de si mesma, não mais diferenciando o sujeito do objeto.

Ao tomar uma xícara de chá, a aparente distinção entre o que toma o chá e o chá desaparece. O simples ato de tomar uma xícara de chá, então, pode-se tomar uma experiência direta e maravilhosa, na qual a separação entre sujeito e objeto não mais existe.

A mente dispersa também é mente, da mesma forma que as ondas que se movem na água também são água. Quando a mente tiver obtido controle de si própria, quando ela não mais se alimentar de ilusões se , tomará mente verdadeira. Mente verdadeira é o nosso verdadeiro eu, é unidade absoluta que não pode ser dividida pela ilusória separatividade das coisas, criadas pelos conceitos e pela linguagem.

(Do livro “Para Viver em Paz” – Thich Nhat Hanh)
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segunda-feira, 21 de maio de 2012

segunda-feira, 14 de maio de 2012

A tartaruga e o coelho


Por Monja Coen Sensei
A versão japonesa da fábula da tartaruga e do coelho é um tanto quanto diferente daquele da minha infância brasileira. Eu a ouvi há poucos dias do Reverendo Miura, que veio do Japão nos visitar.

Conta-se que a tartaruga e o coelho foram apostar uma corrida. O coelho saiu na frente e quando estava no topo de um morro olhou para trás e viu a tartaruga lá longe, tão longe que ele resolveu deitar e dormir.
Passo a passo a tartaruga passou pelo coelho adormecido e chegou em primeiro lugar.

No Japão essa fábula é ensinada para enfatizar a importância da persistência, paciência, continuidade.
No entanto, quando essa história foi contada na Índia houve quem dissesse:

“A tartaruga foi má. Sabe por que? Porque ela não acordou o coelho.”

São maneiras diferentes de se interpretar a mesma história. Talvez a tartaruga devesse ter parado e verificado se o coelho estava bem antes de continuar caminhando lenta e continuamente.

A história do Brasil era diferente. A tartaruga enganava o coelho e chegava primeiro.
Talvez por isso temos tantas pessoas envolvidas na corrupção. Não paramos para ajudar como na Índia, país pobre e sofredor. Nem vamos passo a passo até nossos objetivos, como no Japão, país próspero.

Como seria a versão de Buda?
Saíram juntos o coelho e a tartaruga.

Não se preocupariam em ganhar, mas em criar harmonia com sua passagem. Ofereceriam o prêmio um ao outro, pois não haveria perdedor. Um ganharia pela velocidade. Outro pela persistência.

A tartaruga veria o coelho sair rapidamente. Da poeira levantada onde nem suas patinhas poderiam ser encontradas, a tartaruga apreciando, cada passo, flor, estrada se apiedaria do amigo que na grande correria se esquecia de ver cada detalhe sagrado.

O coelho por sua vez, pernas fortes e longas, se preocupava com a amiga tartaruga, de casco pesado e pernas curtas. Estaria sendo absurda essa competição?

Olhava para trás e a via caminhando, lenta e decididamente. Parava o coelho e a esperava. Perguntava como estava. Juntos descansavam na sombra das árvores. E o melhor é que não havia gol a obter, não havia corrida a ganhar. Tudo que havia era o prazer de viver. Cada um com seu passo, seu estilo, sem competir, caminhando o Caminho, sendo o Caminho iluminado.

E nessa caminhada iam encontrando pessoas e animais, árvores e minerais, água, terra, ar, fogo, tudo que existe e sempre se prontificando a ajudar e a procurar a maneira correta de fazer com que todos percebessem a beleza de caminhar o caminho sem começo e sem fim.

No budismo ambos seriam bodisatvas, seres iluminados disfarçados a mostrar o Caminho verdadeiro a todos os seres.

Essa versão me apetece e se parece sonho, fantasia, ilusão, utopia – é dessa matéria prima sagrada que a vida é celebrada.

Somos um com o mundo. O mundo é uno em nós.

Quando inspiramos o mundo inspira. Além da dualidade o que resta é a unidade.
A diversidade não é rival da unidade. Pelo contrário: no uno tudo está incluído. Cada parte, como um corpo de coração e pulmões, rins e fígado.

Outro monge, Reverendo Saikawa, bebeu de um copo de água. Era a água e eu. Agora a água sou eu. Eu sou a água .

Interconectados. Intersendo.

Olhar capaz de ver com clareza luminosa como espelho de cristal.
Audição de ouvir com clareza sonora como
Espelho de cristal

Assim com todos os sentidos. Tudo vendo, tudo ouvindo, todos os odores sentindo, todos os sabores, na pele o frio, o calor, as texturas.

Mas a mente precisa estar luminosa e aberta, pois se estiver cheia de si mesma não é capaz de se tornar flexível e sensível.

Tartaruga e coelho não se opõem. São. Intersendo.

Cada um é como é. Tem sua função e ação. Se tartaruga quiser ser coelho terá problemas dores, sofrimentos. Não aceitará a si mesma. Estará o tempo todo reclamando, se rejeitando, julgando, se rebaixando. Triste sina.

Se o coelho pensasse ser tartaruga, com uma casa nas costas a se proteger dos caçadores, seria triste seu fim.

Cada um é cada um. Tem valor e tem lugar. Nada é fixo. Não há melhor nem pior. Há o que é correto em sua função e posição.

Ser humano, estrela, cão.

Somos todos apenas você.

E você sou eu.

Texto extraído do site: http://www.monjacoen.com.br/inicio