Palestra proferida por Phap Dung, monge sênior de Thich Nhat Hanh
Manifestações
Buda disse que sofrimento é uma Nobre Verdade. É algo nobre. E temos tanto medo de sofrer, estamos desejando tanto ser feliz, porque não nos conhecemos, desconhecemos nossa alegria, desconhecemos nossa tristeza. Temos somente idéias sobre elas, não as conhecemos realmente. Você apenas tem idéias sobre si mesmo; você não se conhece realmente. Você pode dizer que infelicidade, sofrimento, é também um tipo de felicidade, pois tem a capacidade de lhe ensinar, de lhe ajudar a compreender o verdadeiro valor da vida, o verdadeiro valor da felicidade, o verdadeiro valor do amor, o verdadeiro valor da paciência, o seu verdadeiro valor. Se não consegue sentar-se com o seu sofrimento, você ainda não conhece a si mesmo. Você não sabe quem você é. Você não sabe quem você é. Você ainda não compreendeu a primeira Nobre Verdade ensinada por Buda, nosso professor.
Eu gostaria de desenhar nossa mente [Desenha um círculo] Esta é a nossa mente. Sabemos que a nossa mente tem, pelo menos, dois níveis. [Ele divide o círculo em dois níveis: superior e inferior] Então sua mente tem dois níveis. Um nível é o nível das manifestações e um nível nós o chamamos de nível raiz ou consciência raiz, mulavijñana, a consciência raiz. E neste nível, você tem muitos tipos de sementes. A semente da raiva, a semente do amor, a semente da depressão, a semente da esperança, a semente da alegria, a semente das mágoas, a semente da felicidade - felicidade é uma semente - a semente da infelicidade, a semente da dúvida. Isto é o seu eu. Você tem tudo. Você tem tudo.
E de tempos em tempos a semente se manifesta neste nível como uma flor, como por exemplo, o sentimento de alegria. O amor pode se manifestar. A raiva pode se manifestar. Praticar é ser capaz de reconhecer estas manifestações, que as chamamos de formações mentais... Quando um sentimento feliz está presente no nível superior o chamamos de formação mental. Quando retorna, o chamamos de semente.
Onde você pode se encontrar? Você pode se encontrar nas suas formações mentais. O erro que cometemos é pensar “eu conheço minhas formações mentais”, “eu conheço minha raiva”. De fato, sua raiva quando está se manifestando no nível superior é sempre uma nova manifestação. Não se esqueça disto. Algumas pessoas dizem “nunca mais vou ficar com raiva; agora estou praticando muito bem e nunca mais ficarei com raiva”. Eu penso que estas pessoas não são boas praticantes. Não acho que sejam bons praticantes. É melhor dizer “toda vez que a minha raiva está se manifestando eu consigo reconhecê-la”. É muito melhor! Soa muito melhor, porque você não vive em ignorância.
Não pense que raiva é algo negativo. Quando a pessoa diz “nunca mais ficarei enervado”, isso mostra que àquela pessoa acredita que a raiva é algo negativo. “Eu pratico tão bem, então sorrio todo dia, sou muito feliz. Nunca estou furioso, portanto sou um bom praticante.” Isto é uma idéia que você tem de si mesmo. O seu eu não é assim. Você é uma manifestação, e sua raiva é uma manifestação. Sua raiva só é destrutiva, só é perigosa quando você não a enxerga. Ela só consegue ser destrutiva quando você não compreende sua raiva e não se compreende. Você não enxerga sua raiva porque você não se aceita, não se conhece. Você não tem compreensão de si mesmo. Você quer excluir a raiva de dentro de si.
Desta forma, você não quer que aquilo esteja ali. [Ele apaga o desenho da flor representando a raiva] Mas o que você desconhece é que ela está sempre lá embaixo, quer você queira ou não. Ela sempre está lá na sua consciência raiz, você não consegue excluí-la do nível da consciência raiz. Normalmente as pessoas, não praticantes, pensam em si mesmas como sendo apenas este nível [o superior] e fazem uma discriminação: “Ok, eu quero amor, quero esperança; eu não quero raiva, depressão.” Elas excluem a outra metade delas mesmas. Porque pensam “isto sou eu, e quero excluir o que é negativo e manter o que é positivo.”
Então, mesmo que seu amigo diga “você está furiosa”, você diz “não estou furiosa”, porque não quer aceitar aquilo. Pois acredita que consegue excluir a raiva. O fato, a verdade é que você não consegue excluí-la. Você pode ignorar a manifestação, mas não consegue excluí-la. E se você ignora uma manifestação, isto não é inteligente. Não é inteligente. Quando você ignora uma manifestação, ignora a si mesmo, e vive em ignorância. Você não se vê. Você também está se discriminando. É muito doloroso discriminar-se. Você sabe o quão doloroso é quando as pessoas lhe discriminam? Mas a dor mais profunda ocorre quando você discrimina a si mesmo.
Esta é a sua maior dor. Este é o seu maior sofrimento, quando discrimina a si mesmo. Fazemos isto por acreditar que podemos excluir as manifestações. Isto não é verdade. Você não quer olhar para ela, mas ela ainda está lá. Você não quer que se manifeste, mas ela continua se manifestando - quer você queira ou não, ela continua se manifestando, pois esta lá como semente na consciência raiz.
Portanto, o primeiro erro que cometemos é discriminarmos nós mesmos, por acreditar que somos apenas a consciência manifesta. Somos mais do que a consciência manifesta. Somos também a consciência raiz. Quando você cuida bem da flor, você cuida bem da terra. Quando você cuida bem da terra, você cuida bem da flor. Quando a raiva está se manifestando ela está lhe dizendo algo. Cuidar bem da sua raiva, cuidar bem da flor é remover a sua tendência de discriminar a si mesmo.
E você aceita e diz: “estou furioso e sofro; o sofrimento está se manifestando”. Sentimento desagradável e alegre está se manifestando com sua raiva... tudo bem, estar ali... e, ao mesmo tempo, com a sua raiva. E você consegue reconhecer sua raiva e consegue reconhecer seu sentimento de infelicidade. Não pense que você já se conhece. Não pense isto. Você reconhece isto e aprende a compreendê-lo. A primeira Nobre Verdade é sofrimento, e não pense que é negativa, porque é uma Nobre Verdade. Se fosse negativa como poderia ser chamada de “nobre”?
A segunda Nobre Verdade costumávamos dizer que é a causa do sofrimento, a causa do seu sofrimento. Eu gostaria de chamar a segunda Nobre Verdade “a raiz do sofrimento”; a raiz. Estudando a primeira Nobre Verdade, reconhecendo, aceitando, aprendendo com a raiva, você consegue ver a raiz; e pode entender seu sofrimento. Você consegue compreendê-lo. O primeiro passo, portanto, é reconhecer. O segundo passo é compreender. Quando você reconhece algo tem a chance de compreender aquilo. Você pode entender muitas coisas a partir da sua raiva. Pode ver que ela tem suas raízes lá em baixo. Assim você pára de se culpar. É apenas uma manifestação. Isso é tudo. E mais ainda: é uma bela manifestação.
Sentimento de infelicidade é apenas uma manifestação. É só isso. Mas, além disso, é uma linda manifestação. O que nós também podemos compreender estudando as manifestações e suas raízes é que a discriminação entre muitos tipos de energias só é possível no nível superior; não é possível no nível inferior, no nível raiz. No nível raiz você não consegue distinguir as coisas nitidamente assim, de forma imediata, como está desenhado. Quando cuidamos bem do sentimento de infelicidade, e quando este retorna ao nível raiz, ele tem a capacidade de nutrir o sentimento feliz e retornar de novo na forma de sentimento feliz.
O erro que cometemos é acreditar que quando a energia da raiva está se manifestando e volta a ser semente, ela fica como semente de raiva para sempre. Este é um erro que costumamos cometer – algo do tipo. Isto é produto da nossa discriminação. Neste nível [inferior] as coisas trabalham juntas. Apóiam-se mutuamente. Quando você cuida bem da sua raiva, está cuidando bem também do seu amor. A partir da sua raiva você pode aprofundar o seu amor. Então neste nível, no nível raiz, com compreensão, você vê as coisas trabalhando umas com as outras. Raiva e amor se apóiam, eles trabalham um para o outro. Cuidar bem da sua infelicidade também é cuidar bem da sua felicidade.
Então não é inteligente ignorar o que você chama de manifestações negativas. Se ignorar sua raiva, você se ignora. Se ignorar a sua raiva você ignora o seu amor. Então, onde você pode se achar? Você pode se encontrar na sua consciência, na sua consciência raiz. Você é como uma mãe que consegue abraçar todos os filhos dela, e olha para a manifestação no momento em que ela vem da consciência raiz. É uma manifestação que vem da sua consciência raiz. Mesmo que seja sua raiva, que seja o seu sofrimento, ela é ainda uma manifestação da minha consciência raiz. Ainda sou eu.
Onde você pode se encontrar? Você pode se encontrar na sua consciência raiz. Na consciência raiz você é extremamente rico. Você é muito encantador. [Sino] Se você se conhece, sente-se em casa consigo mesmo, dentro de si. Sentindo-se em casa, você não mais buscará por outra coisa externa que você não tem, porque na consciência raiz você é a Mãe Terra. Você tem tudo. E de tempos em tempos a Mãe Terra lhe oferece lindas manifestações.
Você é uma linda manifestação. Toda manhã, ao se acordar, não se esqueça de se olhar no espelho para se deleitar consigo mesmo. Você é uma linda manifestação. Você continua manifesto até o último instante da sua vida. Todo instante é uma linda manifestação. Mesmo se tiver algum sofrimento, você continua sendo uma linda manifestação da consciência raiz. Todos os seus filhos são lindas manifestações suas. Se você ouve a minha palestra de Dharma e olha mais profundamente, vê que esta é uma nova manifestação de Thây e é uma manifestação totalmente nova. É uma manifestação totalmente nova. Não é a mesma, mas vem da raiz. E você também é uma manifestação de Thây.
Você tem tudo dentro de si. Tudo o que você reconhece em Thây pode reconhecer em você. Isto significa se encontrar na consciência raiz. E nunca pense “somente Thây tem isso, eu não tenho”. Porque pratico, sei que também tenho, e sei que meus irmãos e irmãs também têm. As manifestações deles são apenas outras formas de manifestações. Mas esta é a beleza da vida. Você é uma linda manifestação. Todo dia você se torna uma pessoa inteiramente nova. Aprenda a se conhecer, volte para dentro de si e se descubra, descubra o seu verdadeiro lar, descubra o paraíso dentro de si. Existe um paraíso dentro de você. Mesmo se você encontrar a manifestação do sofrimento, da raiva, este ainda é um paraíso.
De fato, um paraíso só é paraíso quando tem sofrimento, infelicidade e raiva dentro dele. Pare de se discriminar. Esta é a dor mais profunda que você pode experimentar: discriminar-se. Discriminação contra si mesmo é a base para você discriminar outras pessoas. No momento em que você para de discriminar-se, neste momento você para de discriminar as outras pessoas que realmente lhe entristecem. Existe um lar verdadeiro dentro de você, um lar verdadeiro. Feche todas as outras portas. Praticar é deixar só uma porta aberta: a porta que lhe ajuda a voltar-se para dentro de si, para se conhecer.
Você experimenta um tipo profundo de felicidade dentro de si. E ninguém pode fazer isto por você, só você pode. Ninguém pode ajudá-lo a atingir a iluminação. A iluminação precisa ser realizada por você. “Ser iluminado” significa saber quem você é; saber o seu verdadeiro valor. Ser iluminado também significa saber o valor das pessoas que vivem conosco, saber o valor da vida, ver a beleza da vida. Isto é ser iluminado: ver a beleza da vida. Ver quão bela a vida é. A vida é bela para nós desfrutarmos cada instante, em tempos bons e também em tempos ruins. Abra somente uma porta. Feche todas as demais. Abra somente uma porta, a porta que lhe guia no caminho de descobrir quem você é; até você encontrar um lar verdadeiro dentro de si, onde você possa se sentir em casa. Existe um lindo lar, um lar maravilhoso dentro de você esperando que você retorne para desfrutá-lo. Mas só você pode fazer isto. Às vezes você não precisa de nenhuma técnica. Volte para descobrir quão belo, quão maravilhoso você é. Este é o nosso convite. Obrigado.
(Palestra proferida pelo Mestre Pháp Dung, no dia 18 de dezembro de 2008 em Upper Hamlet, Plum Village)
(Traduzido por Maria Goretti)
Caso queira obter esse texto em formato Word clique aqui_uacct = "UA-1096166-2"; urchinTracker();
Buda disse que sofrimento é uma Nobre Verdade. É algo nobre. E temos tanto medo de sofrer, estamos desejando tanto ser feliz, porque não nos conhecemos, desconhecemos nossa alegria, desconhecemos nossa tristeza. Temos somente idéias sobre elas, não as conhecemos realmente. Você apenas tem idéias sobre si mesmo; você não se conhece realmente. Você pode dizer que infelicidade, sofrimento, é também um tipo de felicidade, pois tem a capacidade de lhe ensinar, de lhe ajudar a compreender o verdadeiro valor da vida, o verdadeiro valor da felicidade, o verdadeiro valor do amor, o verdadeiro valor da paciência, o seu verdadeiro valor. Se não consegue sentar-se com o seu sofrimento, você ainda não conhece a si mesmo. Você não sabe quem você é. Você não sabe quem você é. Você ainda não compreendeu a primeira Nobre Verdade ensinada por Buda, nosso professor.
Eu gostaria de desenhar nossa mente [Desenha um círculo] Esta é a nossa mente. Sabemos que a nossa mente tem, pelo menos, dois níveis. [Ele divide o círculo em dois níveis: superior e inferior] Então sua mente tem dois níveis. Um nível é o nível das manifestações e um nível nós o chamamos de nível raiz ou consciência raiz, mulavijñana, a consciência raiz. E neste nível, você tem muitos tipos de sementes. A semente da raiva, a semente do amor, a semente da depressão, a semente da esperança, a semente da alegria, a semente das mágoas, a semente da felicidade - felicidade é uma semente - a semente da infelicidade, a semente da dúvida. Isto é o seu eu. Você tem tudo. Você tem tudo.
E de tempos em tempos a semente se manifesta neste nível como uma flor, como por exemplo, o sentimento de alegria. O amor pode se manifestar. A raiva pode se manifestar. Praticar é ser capaz de reconhecer estas manifestações, que as chamamos de formações mentais... Quando um sentimento feliz está presente no nível superior o chamamos de formação mental. Quando retorna, o chamamos de semente.
Onde você pode se encontrar? Você pode se encontrar nas suas formações mentais. O erro que cometemos é pensar “eu conheço minhas formações mentais”, “eu conheço minha raiva”. De fato, sua raiva quando está se manifestando no nível superior é sempre uma nova manifestação. Não se esqueça disto. Algumas pessoas dizem “nunca mais vou ficar com raiva; agora estou praticando muito bem e nunca mais ficarei com raiva”. Eu penso que estas pessoas não são boas praticantes. Não acho que sejam bons praticantes. É melhor dizer “toda vez que a minha raiva está se manifestando eu consigo reconhecê-la”. É muito melhor! Soa muito melhor, porque você não vive em ignorância.
Não pense que raiva é algo negativo. Quando a pessoa diz “nunca mais ficarei enervado”, isso mostra que àquela pessoa acredita que a raiva é algo negativo. “Eu pratico tão bem, então sorrio todo dia, sou muito feliz. Nunca estou furioso, portanto sou um bom praticante.” Isto é uma idéia que você tem de si mesmo. O seu eu não é assim. Você é uma manifestação, e sua raiva é uma manifestação. Sua raiva só é destrutiva, só é perigosa quando você não a enxerga. Ela só consegue ser destrutiva quando você não compreende sua raiva e não se compreende. Você não enxerga sua raiva porque você não se aceita, não se conhece. Você não tem compreensão de si mesmo. Você quer excluir a raiva de dentro de si.
Desta forma, você não quer que aquilo esteja ali. [Ele apaga o desenho da flor representando a raiva] Mas o que você desconhece é que ela está sempre lá embaixo, quer você queira ou não. Ela sempre está lá na sua consciência raiz, você não consegue excluí-la do nível da consciência raiz. Normalmente as pessoas, não praticantes, pensam em si mesmas como sendo apenas este nível [o superior] e fazem uma discriminação: “Ok, eu quero amor, quero esperança; eu não quero raiva, depressão.” Elas excluem a outra metade delas mesmas. Porque pensam “isto sou eu, e quero excluir o que é negativo e manter o que é positivo.”
Então, mesmo que seu amigo diga “você está furiosa”, você diz “não estou furiosa”, porque não quer aceitar aquilo. Pois acredita que consegue excluir a raiva. O fato, a verdade é que você não consegue excluí-la. Você pode ignorar a manifestação, mas não consegue excluí-la. E se você ignora uma manifestação, isto não é inteligente. Não é inteligente. Quando você ignora uma manifestação, ignora a si mesmo, e vive em ignorância. Você não se vê. Você também está se discriminando. É muito doloroso discriminar-se. Você sabe o quão doloroso é quando as pessoas lhe discriminam? Mas a dor mais profunda ocorre quando você discrimina a si mesmo.
Esta é a sua maior dor. Este é o seu maior sofrimento, quando discrimina a si mesmo. Fazemos isto por acreditar que podemos excluir as manifestações. Isto não é verdade. Você não quer olhar para ela, mas ela ainda está lá. Você não quer que se manifeste, mas ela continua se manifestando - quer você queira ou não, ela continua se manifestando, pois esta lá como semente na consciência raiz.
Portanto, o primeiro erro que cometemos é discriminarmos nós mesmos, por acreditar que somos apenas a consciência manifesta. Somos mais do que a consciência manifesta. Somos também a consciência raiz. Quando você cuida bem da flor, você cuida bem da terra. Quando você cuida bem da terra, você cuida bem da flor. Quando a raiva está se manifestando ela está lhe dizendo algo. Cuidar bem da sua raiva, cuidar bem da flor é remover a sua tendência de discriminar a si mesmo.
E você aceita e diz: “estou furioso e sofro; o sofrimento está se manifestando”. Sentimento desagradável e alegre está se manifestando com sua raiva... tudo bem, estar ali... e, ao mesmo tempo, com a sua raiva. E você consegue reconhecer sua raiva e consegue reconhecer seu sentimento de infelicidade. Não pense que você já se conhece. Não pense isto. Você reconhece isto e aprende a compreendê-lo. A primeira Nobre Verdade é sofrimento, e não pense que é negativa, porque é uma Nobre Verdade. Se fosse negativa como poderia ser chamada de “nobre”?
A segunda Nobre Verdade costumávamos dizer que é a causa do sofrimento, a causa do seu sofrimento. Eu gostaria de chamar a segunda Nobre Verdade “a raiz do sofrimento”; a raiz. Estudando a primeira Nobre Verdade, reconhecendo, aceitando, aprendendo com a raiva, você consegue ver a raiz; e pode entender seu sofrimento. Você consegue compreendê-lo. O primeiro passo, portanto, é reconhecer. O segundo passo é compreender. Quando você reconhece algo tem a chance de compreender aquilo. Você pode entender muitas coisas a partir da sua raiva. Pode ver que ela tem suas raízes lá em baixo. Assim você pára de se culpar. É apenas uma manifestação. Isso é tudo. E mais ainda: é uma bela manifestação.
Sentimento de infelicidade é apenas uma manifestação. É só isso. Mas, além disso, é uma linda manifestação. O que nós também podemos compreender estudando as manifestações e suas raízes é que a discriminação entre muitos tipos de energias só é possível no nível superior; não é possível no nível inferior, no nível raiz. No nível raiz você não consegue distinguir as coisas nitidamente assim, de forma imediata, como está desenhado. Quando cuidamos bem do sentimento de infelicidade, e quando este retorna ao nível raiz, ele tem a capacidade de nutrir o sentimento feliz e retornar de novo na forma de sentimento feliz.
O erro que cometemos é acreditar que quando a energia da raiva está se manifestando e volta a ser semente, ela fica como semente de raiva para sempre. Este é um erro que costumamos cometer – algo do tipo. Isto é produto da nossa discriminação. Neste nível [inferior] as coisas trabalham juntas. Apóiam-se mutuamente. Quando você cuida bem da sua raiva, está cuidando bem também do seu amor. A partir da sua raiva você pode aprofundar o seu amor. Então neste nível, no nível raiz, com compreensão, você vê as coisas trabalhando umas com as outras. Raiva e amor se apóiam, eles trabalham um para o outro. Cuidar bem da sua infelicidade também é cuidar bem da sua felicidade.
Então não é inteligente ignorar o que você chama de manifestações negativas. Se ignorar sua raiva, você se ignora. Se ignorar a sua raiva você ignora o seu amor. Então, onde você pode se achar? Você pode se encontrar na sua consciência, na sua consciência raiz. Você é como uma mãe que consegue abraçar todos os filhos dela, e olha para a manifestação no momento em que ela vem da consciência raiz. É uma manifestação que vem da sua consciência raiz. Mesmo que seja sua raiva, que seja o seu sofrimento, ela é ainda uma manifestação da minha consciência raiz. Ainda sou eu.
Onde você pode se encontrar? Você pode se encontrar na sua consciência raiz. Na consciência raiz você é extremamente rico. Você é muito encantador. [Sino] Se você se conhece, sente-se em casa consigo mesmo, dentro de si. Sentindo-se em casa, você não mais buscará por outra coisa externa que você não tem, porque na consciência raiz você é a Mãe Terra. Você tem tudo. E de tempos em tempos a Mãe Terra lhe oferece lindas manifestações.
Você é uma linda manifestação. Toda manhã, ao se acordar, não se esqueça de se olhar no espelho para se deleitar consigo mesmo. Você é uma linda manifestação. Você continua manifesto até o último instante da sua vida. Todo instante é uma linda manifestação. Mesmo se tiver algum sofrimento, você continua sendo uma linda manifestação da consciência raiz. Todos os seus filhos são lindas manifestações suas. Se você ouve a minha palestra de Dharma e olha mais profundamente, vê que esta é uma nova manifestação de Thây e é uma manifestação totalmente nova. É uma manifestação totalmente nova. Não é a mesma, mas vem da raiz. E você também é uma manifestação de Thây.
Você tem tudo dentro de si. Tudo o que você reconhece em Thây pode reconhecer em você. Isto significa se encontrar na consciência raiz. E nunca pense “somente Thây tem isso, eu não tenho”. Porque pratico, sei que também tenho, e sei que meus irmãos e irmãs também têm. As manifestações deles são apenas outras formas de manifestações. Mas esta é a beleza da vida. Você é uma linda manifestação. Todo dia você se torna uma pessoa inteiramente nova. Aprenda a se conhecer, volte para dentro de si e se descubra, descubra o seu verdadeiro lar, descubra o paraíso dentro de si. Existe um paraíso dentro de você. Mesmo se você encontrar a manifestação do sofrimento, da raiva, este ainda é um paraíso.
De fato, um paraíso só é paraíso quando tem sofrimento, infelicidade e raiva dentro dele. Pare de se discriminar. Esta é a dor mais profunda que você pode experimentar: discriminar-se. Discriminação contra si mesmo é a base para você discriminar outras pessoas. No momento em que você para de discriminar-se, neste momento você para de discriminar as outras pessoas que realmente lhe entristecem. Existe um lar verdadeiro dentro de você, um lar verdadeiro. Feche todas as outras portas. Praticar é deixar só uma porta aberta: a porta que lhe ajuda a voltar-se para dentro de si, para se conhecer.
Você experimenta um tipo profundo de felicidade dentro de si. E ninguém pode fazer isto por você, só você pode. Ninguém pode ajudá-lo a atingir a iluminação. A iluminação precisa ser realizada por você. “Ser iluminado” significa saber quem você é; saber o seu verdadeiro valor. Ser iluminado também significa saber o valor das pessoas que vivem conosco, saber o valor da vida, ver a beleza da vida. Isto é ser iluminado: ver a beleza da vida. Ver quão bela a vida é. A vida é bela para nós desfrutarmos cada instante, em tempos bons e também em tempos ruins. Abra somente uma porta. Feche todas as demais. Abra somente uma porta, a porta que lhe guia no caminho de descobrir quem você é; até você encontrar um lar verdadeiro dentro de si, onde você possa se sentir em casa. Existe um lindo lar, um lar maravilhoso dentro de você esperando que você retorne para desfrutá-lo. Mas só você pode fazer isto. Às vezes você não precisa de nenhuma técnica. Volte para descobrir quão belo, quão maravilhoso você é. Este é o nosso convite. Obrigado.
(Palestra proferida pelo Mestre Pháp Dung, no dia 18 de dezembro de 2008 em Upper Hamlet, Plum Village)
(Traduzido por Maria Goretti)
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