Por Lama Padma Samten
Visão é essencial à gestão, por isso precisamos de uma nova inteligência. As dificuldades que enfrentamos hoje vêm do fato de que a formação dos gestores leva-os a uma visão imprópria da realidade. Leva-os a uma circunstância onde os obstáculos e sinais não auspiciosos se multiplicam em todas as áreas. A economia e a gestão evidentemente atuam dentro de um ambiente sutil volátil e não em um mundo fixo e matemático. É um mundo onde sentimentos, emoções, impulsos, sonhos e medos têm o poder de criar realidades e definir as ações a serem tomadas. Hoje percebe-se a importância de trazer aos gestores uma abordagem mais ampla onde se possa compreender melhor os fatores imponderáveis que teimam em flutuar diante dos olhos, afetando planejamentos e sonhos aparentemente tão bem estruturados. Niels Bohr, Prêmio Nobel de Física, formulador da abordagem filosófica da física quântica, a teoria da complementaridade, enfrentou dificuldades semelhantes na física do mundo microscópico, onde o comportamento da matéria parecia demasiado estranho e imprevisível. Devemos a ele especialmente a reintrodução da importância do papel do observador na constituição da realidade, que parece algo externo ao observador. Niels Bohr evidenciou de modo acadêmico que a não inclusão da influência do observador no que parece ser um mundo externo desconsiderava uma variável do problema, e isso produzia ambiguidades na compreensão dos universos de estudo considerados. Numa linguagem budista, as coisas são sempre definidas em nível sutil, construímos mundos que parecem externos e ficamos presos a eles. Sua Santidade o Dalai Lama, Prêmio Nobel da Paz de 1989, diz que a mente é livre e luminosa, pode sonhar coisas positivas e negativas. Quando cria o que é positivo, isso resulta em felicidade e equilíbrio; quando cria negatividades, isso resulta em sofrimentos e dificuldades. William James, assim como Ludwig Wittgenstein, desde o final do século XIX já apontava de modo minucioso a importância da compreensão do papel do observador no tratamento da realidade. Essencialmente, nossa visão fica limitada ao espaço abstrato das possibilidades que sonhamos. A realidade como a sonhamos – trata-se de um sonho que vemos mesmo quando despertos – delimita as possibilidades do que pode ser visto e do que não será visto. Estamos presos aos mundos, referenciais, opções e sonhos que construímos. Compreendendo o poder decisivo desse elemento, não somos mais vítimas de realidades externas, mas entendemos que temos o recurso de sonhar mundos mais positivos. Quando entendemos isso, novas palavras ganham sentido: inseparatividade, coemergência, impermanência, sofrimento, sustentabilidade, complexidade, complementaridade, mandala. Essa complexidade permite ações eficientes, que consideram as variáveis verdadeiramente presentes. A solidez da realidade vem de dentro dos sonhos, dessa região sutil surge o referencial das nossas ações e não de uma aparente realidade rígida e externa. Somos desafiados a sonhar na direção correta. É o exercício de uma liberdade para a qual talvez nunca tenhamos sido treinados pelo sistema de ensino, não importa por quantos anos o tenhamos percorrido. De Sua Santidade o Dalai Lama vem o conselho do bom senso: nossas ações deveriam ter por objetivo causar felicidade e não causar sofrimento. É simples na forma, profundamente desafiador na ação. E essencial como motivação básica, como eixo para todas as nossas ações. É evidente que a ação dos cientistas deveria resultar em felicidade e não em sofrimento, assim como as ações dos administradores, economistas, engenheiros, médicos, políticos, produtores rurais, professores, pais e mães. Isso é apenas bom senso. Na visão budista, nossa existência no mundo se dá através de processos de relação; portanto, nossas ações deveriam ter como meta produzir melhores relações de nós conosco mesmo, com as outras pessoas, com as autoridades locais e com a natureza. É evidente que relações negativas conosco mesmo, com os outros, com as autoridades e com a natureza vão causar problemas. Nesse ponto há um componente adicional mágico da realidade: observamos que, ao agir segundo esses referenciais, surge em nós a experiência de uma energia natural e positiva, e também de felicidade. Observamos que, se esse referencial não está presente, mesmo que estejamos brilhando em meio a vitórias e desafios, não há felicidade e nossa energia flui com esforço. Na ausência de uma motivação positiva, nossa vida parece carecer de sentido e eventualmente dá a sensação de um fardo pesado. A falta de referenciais positivos está na raiz dos desequilíbrios sociais e individuais que têm se manifestado como uma epidemia. Vivemos um novo gulag. Uma cultura impõe sobre nós sentidos e significados aparentemente fixos, externos, reais, mas as consequências negativas na forma de desequilíbrios são diagnosticadas como fragilidades individuais. Assim, as vítimas dos referenciais dessa cultura são punidas por seu comportamento e, quando esgotadas, são tratadas individualmente como doentes físicos e mentais. Questões amplas são reduzidas a questões individuais. Como resultado não há progresso na repressão às agressões a nós, aos outros, às lideranças locais e à natureza, e tampouco no que diz respeito ao equilíbrio interno e à felicidade. Na perspectiva budista, precisamos avançar para uma visão que abarque todos os componentes da realidade. Ao assumir os recursos da visão mais ampla, nossas ações se tornam naturalmente positivas, sem a necessidade de regras e repressão. Além disso, surge progressiva tranquilidade e felicidade, e reconhecemos a preciosidade da vida humana que temos. Surge a experiência da mandala da lucidez. A mandala é do que precisamos desde sempre, individual e coletivamente. Nossa necessidade pode ser resumida em uma palavra
Nenhum comentário:
Postar um comentário